As ondas da Rádio Moçambique e o jornalismo no país

Um dos diretores da RM fala sobre a história do veículo e mostra sua visão sobre o alcance do jornalismo no país

Antônio Miguel Npassoa, nasceu em 11 de junho de 1971, em Caia, na província de Sofala. É licenciado em Linguística pela Universidade Eduardo Mondlane.

Durante muitos anos foi jornalista cultural freelancer, tendo publicado vários artigos em importantes veículos impressos do país, os jornais: “Savana” e “Notícias”.

É profissional de rádio desde o final da década de 80. É também professor universitário e consultor. O novo entrevistado do “Terras de Moçambique”, é ainda diretor do Depto de Línguas da Rádio Moçambique – a maior rádio do país. Autor do livro: Serviço Público de Radiodifusão – Desafios do Presente e do Futuro, Ndapassoa, fala sobre a história da rádio pública de Moçambique, explica como o veículo chega a todas as províncias do país, e esclarece como a rádio trabalha com o uso das línguas e dialetos locais  para chegar ao seu público, com um foco permanente no resgate da identidade nacional.

O diretor da RM, aborda também questões como a profissão de jornalismo na África Austral, menciona a diferença entre uma rádio pública e uma rádio estatal, faz um diagnóstico da liberdade de expressão por aqui e levanta a discussão da obrigatoriedade da formação superior em jornalimo, para se exercer a profissão (aqui também vivemos esse dilema do diploma). Já no final da entrevista concedida, o professor menciona ainda as dificuldades dos moçambicanos em ingressar no ensino superior e vislumbra futuros melhores para os jovens.

Clique no vídeo abaixo e saiba mais sobre esses assuntos, que são bastante importantes na vida do moçambicano.

Espero que tenha gostado. Hambanine e até a próximo post!

O que é o “changana”?

Dialeto falado em Maputo e outras línguas

De acordo com o último recenseamento em Moçambique, “o idioma português mesmo sendo considerado a língua materna é falado apenas por 40% da população”. Interessante não? Em Maputo, sua capital, a maioria das pessoas falam um ou dois dialetos pelo menos. E o dialeto mais falado aqui é o changana.

O que me motivou a escrever esse post e falar sobre um dialeto que desconheço foi perceber a importância disso para o moçambicano. Tem a ver com a identidade do povo. E o “dialeto”, seja de que região for do país é, verdadeiramente, a expressão linguística da população aqui.

Faz parte do dia a dia do povo e isso me fez lembrar os nossos queridos e esquecidos tupi e guarani. Uma pena não os aprendermos na escola. Tantas cidades brasileiras com nomes indígenas e sequer sabemos o significado real disso.Tantas palavras de origem indígena em nosso português falado no Brasil e não nos atentamos sobre a questão.

Como mencionei acima, na apuração que fiz fiquei sabendo que, de acordo com Recenseamento Geral de 2007 em Moçambique, apenas 40% da população fala o português. Isso comprova essa diversidade linguística em Moçambique.

Já em Maputo, a mesma pesquisa apontou que 90% dos que vivem na capital falam correntemente a língua portuguesa. É interessante observar que a Constituição de Moçambique encara outros 30 idiomas de origem bantu, como por exemplo: o chona, o ronga, o ndau, o sena, o chope, o echuwabo e o maconde como línguas locais. Todos esses dialetos (mais de trinta) são dos troncos linguísticos bantu e são considerados pela Carta Magna do país também como línguas nacionais.

O dialeto falado na capital e em outras províncias

Em Maputo fala-se português em todos os sítios (lugares, como dizem por aqui) e sou compreendido perfeitamente. Mas, se afastando um pouco da capital, você pode se deparar com pessoas falando apenas os dialetos do lugar.

Logo quando cheguei em Moçambique fiz uma viagem a Cidade da Beira, capital da província (estado) de Sofala. São cerca de 1200 km até lá. Atravessei algumas províncias para chegar ao destino: Maputo, Gaza, Inhambane, Manica e parte de Sofala. E nessa viagem pude experimentar na pele, dentro de um “machibombo” (ônibus, em changana), o quão difícil é se comunicar nesse país para um estrangeiro. São muitos dialetos e cada província tem dois ou três diversos.

Ave Maria no dialeto changana

Aqui em Maputo, cidade que vivo, a língua mais falada é o changana e nesses quase dois meses aqui, aprendi algumas palavras no dialeto que agora, divido contigo. Às vezes, a pronúncia é um pouco complicada para nós brasileiros. Então, para explicar bem as palavras optei por escrevê-las do jeito que se fala.

Vamos a elas:

Hambanine quer dizer “tchau”;

Dzichile quer dizer “bom dia”;

Brada quer dizer “amigo ou irmão”;

Machibombo quer dizer “ônibus”;

Chapa quer dizer “van”;

Wena quer dizer “você”;

Malimune quer dizer “quanto Custa”;

Tchova – quer dizer “empurre”;

Male quer dizer “dinheiro”;

Marrala quer dizer “grátis”;

Xá dura quer dizer “está caro”;

Nalava quer dizer “quero”;

 Maningue quer dizer “muito”;

 Kamimambo quer dizer “obrigado”;

Kamimambo Nikencile quer dizer “eu que agradeço”;

 Kaiyssa quer dizer “está quente”;

Uwenamane vito quer dizer “como é o seu nome?”;

 Nalava Wena quer dizer “quero você”;

Nalava Male quer dizer “quero dinheiro”;

 Mumble quer dizer “menina”;

Jarra quer dizer “menino”.

Procurei alguns vídeos para mostrá-lo (a) a fonética do dialeto changana. Mas não achei muito coisa interessante que valeria à pena. Então, seguem abaixos dois vídeos que achei legais. O primeiro é uma música cantada em changana, e o segundo é uma brincadeira gostosa de crianças na capital de Moçambique.

 

Um dicionário em changana, o neologismo e o inglês

Soube que há dicionários que traduzem os idiomas falados na África Austral para o português e o inglês (mas ainda não os vi nas livrarias). Conversando com um professor na Politécnica (onde estudo), fui informado que em 2011 foi publicado o primeiro dicionário especificamente do “idioma changana”. O projeto de criação do dicionário partiu de professores da Universidade Eduardo Mondlane (a maior do país) que fazem parte do Centro de Estudos Africanos. A iniciativa foi a primeira do gênero aqui. Bacana não?

Para além dos dialetos percebo aqui a criação de vários neologismos partindo da língua portuguesa. É comum uma mistura entre o português falado aqui e os dialetos locais. Quer saber mais sobre essa diversidade da “nossa língua-irmã” falada em Moçambique? Então, clique aqui. 

O português falado em Moçambique, ao contrário do que se fala no Brasil, é bastante similar ao do país que nos colonizou. Isso nos conta que em termos de regras de ortografia, o moçambicano escreve bem próximo ao que é escrito em Portugal. E olha que interessante! O inglês aqui é super falado.

Quase todos os moçambicanos que conheci falam fluentemente o idioma. Talvez seja pelo fato de que Moçambique tem países vizinhos que falam o inglês ou quem sabe pelo grande número de estrangeiros que vivem aqui. Conclusões precipitadas sobre isso ou não, fato é que o moçambicano tem uma grande familiaridade com essa língua também.

Espero que tenha gostado! Hambanine e até o próximo post!

Moçambique – Dos primórdios à colonização portuguesa

Estamos no segundo post da série sobre a história de Moçambique. Pois bem, como disse no post anterior, não sou dono da verdade e nem tenho esse desejo. O que trato a seguir talvez venha um pouco influenciado pelas informações que tive acesso. E aqui há somente uma interpretação da vasta história desse país, ok? Que fique (me permita) “muuuuiiiito” claro isso!

Não há aqui uma verdade absoluta, apenas segue um recorte (talvez um “pouquinho” apaixonado – risos) da história de Moçambique. Então, reiterando essas afirmações, vamos ao que nos conta o “Ensaio sobre a Cultura em Moçambique”, de Carlos Jorge Siliya.

No atual território de “Moz”, entre os anos de 200 e 300 d. c., ocorreram muitas migrações de povos Bantus, vindos do entorno dos Grandes Lagos ao norte do país. Havia aqui, naquela época, duas comunidades bem organizadas: os Monomotapas  e os Suailis.

E nos finais do séc. VI nas zonas costeiras se estabeleceram as primeiras tendas comerciais pertencentes aos Swahilárabes (junção dos negros com os árabes), que viveram por muito tempo da troca de mercadorias.

”Portugas” na área

No séc. XV, os danadinhos chegam até aqui. Foi um cidadão de nome Pêro da Covilhã, o primeiro português a estabelecer relações comerciais com os povos desta região.

Naquele momento, pelo que conta algumas livretos que andei folheando, ele excursionava pela costa do atual território de Moçambique a pedido de D. João II.

Depois que o portuga se deu conta do “achado”, fez logo as vezes de comunicar por carta à Coroa Portuguesa de que havia “encontrado” uma terrinha, digamos, bem propícia  aos interesses portugueses.

E aqui (me desculpe) pausa para a piada. Sabe quem veio na sequência e pisou nas “Terras de Moçambique”?  Foi o Vasco da Gama. Não o clube de futebol que estamos acostumados a vê-lo todos os anos levar os vice-campeonatos no Brasil (desculpe a piadinha – mas não poderia perder a oportunidade dessa alfinetada – risos), mas o original, que representava à Companhia Portuguesa das Índias. Dito isso, vamos à sequência do que andei pesquisando.

Pelo que li em um almanaque de Moçambique, desde 1502 até meados do séc.XVIII, os portugueses entenderam que o país representava uma rota estratégica no caminho marítimo para a Índia.

Seguindo então essa rota, a presença deles por aqui se intensificou. Mais precisamente em Sofala e na Ilha de Moçambique no início. Nesses locais, foram criadas as primeiras feitorias e fortalezas. O objetivo era um só: o comércio.

Somente anos depois, os portugueses que tentavam encontrar, dominar e explorar as zonas auríferas, se aventuraram pelo interior do país, onde construíram novas fortalezas. Os produtos mais comercializados naquele momento eram o marfim e o cobre. E havia uma tentativa por parte dos portugueses em encontrar a qualquer custo o ouro de Moçambique.

Já no séc.XVII, à semelhança do que ocorreu em terras tupiniquins, quando criaram as famosas Sesmarias, a Coroa Portuguesa estabeleceu um regime de concessões de terras por aqui: os chamados “Prazos”. Uma espécie de feudos doados pelo que entendi do livro de Siliya, e isso marcou o primeiro estágio da colonização portuguesa.

Os “prazeiros” (donos dos Prazos), profundamente envolvidos no comércio de escravos impulsionaram a colonização portuguesa.

Fim dos “Prazos” e tráfico negreiro

Com a extinção dos “prazos” em 1832, por decreto régio, e com a emergência dos estados militares, iniciou-se o comércio de escravos que se manteve mesmo após a abolição da escravatura nas Colônias, em 1889.

Há um relato bem interessante no livro de Siliya que fala que (…) “calcula-se que entre 1780-1800 tenham sido exportados de Moçambique em média anual, entre 10 a 15 mil pessoas e, em 1800-1850 a média anual tenha atingido cerca de 25 mil”.

“Um comércio extremamente lucrativo para negreiros árabes, suailis e europeus” – portugueses, franceses, ingleses, holandeses e austríacos, lucraram muito nessa brincadeira.

Conferência de Berlim

A colonização efetiva de Moçambique só se inicia verdadeiramente sob o impulso da Conferência de Berlim, em 1885, quando as principais potências europeias fizeram a partilha da África. Esse acordo obrigava os portugueses a uma ocupação efetiva de todo o território que era reconhecido como seu naquela conferência, e se me permita, foi uma grande negociata tudo isso. Uma pena!

Moçambique então, à semelhança do que acontecia em outras colônias europeias, começa a ser administrado por grandes companhias magestáticas a quem o Estado Português concedeu vastos territórios. E isso foi fruto de discórdia, logicamente. A ocupação desses territórios e o desumano processo de mercantilização dos negros impulsionaram revoltas internas no país.

Resistência

A ocupação colonial nunca foi pacífica, tendo-se verificado até o início do séc.XX forte resistência por parte de vários chefes tribais como Mawewe e Ngungunhama.

À semelhança do que aconteceu noutros colônias portuguesas, Moçambique também se rebelou contra a ocupação colonial portuguesa iniciando sua luta armada, mas isso é tema para o próximo post.

Hambanine, até lá!